Pai de Santo: Pedro Gabriel Santos de Jesus
História:
Comecei minha missão no Jarê desde pequeno. Um tio meu também tinha o mesmo dom, só que ele não quis tomar conta do dom dele. Depois que ele faleceu, eu vim para o ventre da minha mãe. Quando nasci, veio o sofrimento. Eu ia para a escola, e não aguentava brincar. Me achava um anormal no meio das outras crianças, porque eu via todas elas correndo para cima e para baixo, e eu ali sem poder participar das brincadeiras delas. Eu não podia jogar futebol, porque ouvia uma voz que me dizia que ia quebrar minhas pernas, que eu tinha que ir acender uma vela. O tempo que tinha para diversão era só o recreio. Eu ia da escola para casa e de casa para a escola, não tinha convivência com amigos. Até hoje é assim, mas agora é da escola para o terreiro e do terreiro para a escola.
Entre sete e oito anos eu passava muito tempo deitado na cama. Então, fui atrás do terreiro de Jarê Pai Gil de Ogum, que me recebeu, fez a obrigação, mas o Orixá não conseguiu fazer minha corrente. Aí eu procurei outro terreiro, em Utinga, que tinha uma mestra que vinha de Cachoeira, chamada Irani. Ela sabia tomar conta do meu Orixá e preparou tudo certinho. Comecei o meu processo com 12 anos. Fui catulado e cheguei a passar sete dias dentro de um quarto, só eu e as minhas entidades, recebendo muitas visitas de Orixás. Aos poucos fui me doutrinando, até que estava pronto para assumir o meu terreiro. Eu tinha 16 anos. Hoje estou com 17 e tenho uns 20 filhos de santo. Minha mãe de santo é Irani de Utinga.
Os meus guias de frente, que mais trabalham no terreiro, são: Boiadeiro, Oxóssi, Xavante, Xangô. E o pai do nosso terreiro é Ogum de ronda, nosso consultante de mesa. Se alguém tem um problema, é ele que a gente chama, não pode vir outro orixá. Ele vem ver de que o paciente precisa, o que sente, se ele tem Egum. Para chamar o consultante de mesa, a gente usa o sino adjá. Você se prepara, se veste, salva o Orixá de coroa, o Orixá de colo, o Orixá de deca. Aí você chama seu Orixá de mesa com o adjá.
É assim uma das cantigas de meu pai Ogum:
Ogunhe abaporinho
Ogum é cavaleiro
Ele veio de Aruanda
Montado em seu cavalo
Ele é o chefe da Umbanda
Ogum é cavaleiro
Ele veio de Aruanda
Montado em seu cavalo
Ele é o chefe da Umbanda
Os atabaques também significam muito na religião. O primeiro toque é para Oxalá, o segundo é para Ogum, o terceiro é para Oya… Sem os toques, os Orixás não descem para fazer o trabalho. Cada um tem uma função específica. Sem o toque de Oyá, por exemplo, o Boiadeiro não desce para carregar o cordão de ariaxé.
No cordão de ariaxé, o Boiadeiro, assim que chega, pega uma taca para trabalhar a “intimidação de escravo”. Quando o escravo vê um vaqueiro com o chapéu (símbolo dele) e o jaleco de couro (sua veste), ele se intimida e fica mais fácil ir embora. Sem o jaleco, o Boiadeiro não é nada, como diz a música:
Ô, lá em cima da serra
Que a onça pegou meu cachorro
Arreia, arreia, vaqueiro
Ô, me dá meu jaleco de couro
Lá em cima da serra
Que a onça pegou meu cachorro
Arreia, arreia, vaqueiro
Ô me dá meu jaleco de couro
Quando eu tinha uns 13 anos, cheguei a pensar em desistir. Falei com minha mãe para procurar nossa mestra e falar para ela amarrar tudo, que eu não queria mais. Só que me dei mal. Falei isso à tarde, e à noite caí na cama cego. Gritava minha mãe e minha avó, e não enxergava nada na minha frente. Elas já achavam que eu ia morrer, quando acendeu uma luz de Oxóssi, que clareou minha vista. Ele desceu e falou: “Ou vosmecê cumpre sua missão ou levaremos vosmecê daqui”. Desde então, não rejeitei mais.
Hoje, a religião é tudo para mim, é minha vida, é meu cantinho, é o que eu mais gosto de fazer. Eu vivo para ela, e ela vive para mim. Já ouvi muitas críticas na rua, mas meus Orixás não me deixam abater. Na macumba eu nasci, na macumba me criarei, e na macumba vou morrer.
Para os jovens que estão entrando agora em nossa religião, aproveito para falar que o Jarê é paz, amor, conforto, bondade e caridade. O que fazemos é tirar o que há de ruim do mundo lá fora e levar o mundo da verdade, o mundo de Deus.
Odé comorodé
Odé arerê
Odé comorodé
Odé odé arerê
Data e nomes das Festas:
21 de Janeiro – Festa de Oxossi
30 de Maio – Festa de Boiadeiro
30 de Setembro – Cosme e Damião