Terreiro de Iansã e Vovó Maria Konga

Mãe de Santo: Marinalva Pinheiro Queiroz (Dinha)

História:

O meu contato com o Jarê começou quando fui descobrindo minha mediunidade. Em minha família, tenho uma irmã que também é médium, mas ela se tornou crente, e não acredita nesse dom de ver as coisas. No meu caso, descobri com muito sofrimento, passando por diversas coisas que só me fizeram acordar para a vida mesmo depois que perdi minhas duas filhas. Aí meu chão desmoronou. Eu tinha três filhos, um homem e duas meninas que faleceram. Quando as meninas adoeceram, eu não encontrei nenhuma porta aberta que me auxiliasse para evitar isso.

A primeira tinha 13 anos, e eu fui com minha tia na casa de uma mulher para procurar entender o que tinha acontecido e acabei ficando com mais medo ainda. Cheguei a ir a várias casas nas cidades de Lençóis e Nazaré das Farinhas, e todos falavam a mesma coisa. E eu fui tendo as visões. Lembro que antes de perder minhas filhas, cheguei a ver o caixão na porta e a minha filha deitada no quarto como um anjo. Sentia como se algo estivesse me avisando que ia perdê-la, aí fui pedindo a Deus uma saída para aquilo. Fiquei desesperada. Foi nesse momento que encontrei Betinho, que chegou aqui uma vez, em Tanquinho, e bateu a testa dele na minha, dizendo: ‘’minha filha, ninguém te derruba’’. E eu pensava: “meu deus do céu, ninguém me derruba mesmo, não. Só Deus para me derrubar”. Mas mesmo assim ainda não entendia aquilo tudo que eu estava sentindo.

Cheguei a ir a vários curandeiros, e ninguém me deu saída. Alguns que falavam que eu era sabida, outros falavam que nada me derrubava, mas ninguém me falou o que eu tinha. Eu injuriei tanto, que teve uma hora que eu falei: “moço, estou aqui atrás de saber da minha filha”. Aí ele falou que eu tinha que cuidar dela, se não ia perdê-la. Mas as portas estavam fechadas para mim, e não teve jeito. Foi numa dessas que eu resolvi entrar para a lei de crente, acreditando que eu veria Deus, e ele iria me ajudar. Nisso me apareceram dois meninos que vinham sempre em meus sonhos, mas eu não queria aceitar ajuda, pensando que eles fossem do demônio. Eles disseram que, como eu não queria a ajuda deles, não iriam mais aparecer. Os meninos sumiram, e em seguida minha filha morreu.

A minha segunda filha tinha seis anos quando passou pelas mesmas coisas, os mesmos sofrimentos. Esses meninos apareciam dizendo que iriam me ajudar, tornavam a voltar, e eu dizia que não queria eles junto de mim – porque não entendia nada. Aí fui de novo tendo as visões, vendo o velório com aquele tanto de gente chorando. E continuava sem entender o que era, porque a minha mente ficava toda confusa. Não tinha achado um filho de Deus para me falar o que estava acontecendo. Fazia nove meses que eu tinha perdido a primeira filha, aí em seguida perdi a outra.

Depois de tudo isso, resolvi sair da igreja, porque vi que a lei de crente não era o meu destino. Procurava ajuda, e ninguém me ajudava. Aí teve um dia que, em um sonho, eu estava em um deserto quando apareceu um velho e uma mulher vestidos de branco, ela de véu e grinalda. Nesse sonho eu pedi ajuda a Deus, porque não sabia mais o que fazer, e essa mulher me abraçou. Ela disse para eu repetir esta oração toda vez que saísse: “da minha casa eu vou saindo, nesse caminho eu vou andando, com Deus na minha frente, e Nossa Senhora me acompanhando”. Ao acordar fiquei me questionando o que tinha sido aquilo. Essas palavras estão na minha mente até hoje.

Fui então visitar uma mulher que morava em Wagner, com minha tia Antônia, que dizia que ela era muito boa. Quando chegamos à porta, a mulher mandou eu entrar e perguntou se eu sabia que era médium. Eu falei que ninguém nunca tinha me falado, mas ela confirmou que eu era e teria que trabalhar isso. Cheguei a questionar minha mediunidade, porque tinha perdido minhas filhas e passado por muito sofrimento, tomando remédio faixa preta durante um ano para tentar superar tudo. Mas a mulher me alertou que todo mundo que pega esse cargo sofre.

Fiz a obrigação e fiquei quatro anos na casa dela, aí decidi que não iria mais frequentar o Jarê. Só que meu filho teve um acidente e quase morreu. Eu falei: “meu deus, já foram duas, agora três?”. Quando cheguei ao hospital, meu filho estava praticamente morto, em coma. Três dias depois, encontrei uma velha que me deu um galho de mato verde e um dente de alho para tratar meu filho, e foi me mostrando como eu faria os movimentos nos pés e nas mãos dele. Fiquei com receio de os médicos não me deixarem entrar na UTI com essas coisas, mas mesmo assim eu coloquei tudo dentro do bolso e entrei para ver meu filho. Fui passando o alho nos dedos dele e, quando o médico saiu, passei também o galhinho de mato verde. Como eu não sabia rezar nada, saí de lá pedindo aos orixás e caboclos para cuidarem do meu filho, e não deixarem ele ir embora.

Passei uns 20 dias de sofrimento, quando do nada, em um sonho, eu vi uma pessoa me mandando estender uma roupa no chão e circular de vela. Eu estava tão desesperada de perder o meu filho, que eu falei: “seja lá o que Deus quiser, eu vou seguir o meu sonho”. Peguei o meu terço, ajoelhei e fiz a oração. As palavras vieram, e as velas se acenderam. Assim como o fogo subiu, meu filho também “subiu”. Nessa hora, pensei que ele tinha morrido. Corri para o hospital desesperada, e uma moça me parou dizendo que tinha uma noticia para mim. Nem esperei e fui logo pegar a mão dele. Quase caí para trás: meu filho tinha aberto o olho e me pediu a benção. Agradeci a Deus e aos orixás e prometi que continuaria os trabalhos com eles.

Daí em diante, comecei a rezar gente e, desde 2015, comecei a dar caruru. Compreendi todo aquele sofrimento, retomei a fé nos orixás e consegui construir a minha casa. Hoje rezo só de “olhado”, porque se for outro tipo de oração é a velha Nanã que faz as coisas. Ela quando vem diz o que está acontecendo e avisa logo o que a pessoa tem, assim como vem também Ogum, Cosme e Damião e Iansã, que é a rainha.

Os guias de frente da casa são Santa Bárbara, Cosme e Damião e Ogum. Os outros orixás e caboclos são Boiadeiro, Vaqueiros, Oxumarê, Oxum, Sereia Iemanjá, Nossa Senhora Aparecida, Pai Oxalá, Nossa Senhora da Guia, Nossa senhora de Fátima, Jurema, Obaluaê e Marujo Martins Pescador – que é meu anjo da guarda. Não deixo nunca de acender a luz e rezar para ele antes de tudo..

Sobre os colares, cada um tem a parte de caboclo, cada um tem um significado, cada cor é de um encantado. Para não colocar vários colares, eu coloco um que já serve para todos os orixás – o marrom é o Boiadeiro, os velhos Nanã, a Preta Velha e o Preto Velho. Aí eu rezo o meu terço todinho, porque não saio de casa sem fazer minhas rezas.

Data e nomes das Festas: 

23 de setembro – Cosme e Damião

23 de dezembro – Santa Bárbara