Terreiro de Mesa Branca de Ogum e Iemanjá

Pai de Santo: Valdemir de Matos (Batalha)

História:

Fui adotado em Salvador e por isso nem sei onde nasci. Fui pego no orfanato por Dona Lourdes e sua irmã Lídia. Dona Lídia queria uma criança para adotar e quando chegou ao orfanato me achou engraçado e bonito. Aí me pegaram para criar. Nessa época eu tinha entre 3 e 5 anos. Eu não sei muito da minha história, já até tentei verificar no orfanato, mas acho que mãe é aquela que cria. Talvez se eu for procurar eu tenha uma decepção pior.

Minha família virou dona Lourdes Freire e seu Mira, o marido dela, mais os filhos Olga, Marcos, Alex, Mariângela, Ana Claudia, Gracinha e Sueli, que também era adotada. Eu era o caçula dos homens, e minha mãe mãe era branca. Com o tempo eu fui vendo que naquela família eu só tinha o amor de Lourdes, e acabava sendo quase um empregado, que ajudava nos afazeres da casa. Eu tive alguns problemas, mas foram eles que me deram educação e, com isso, tive acesso a bons colégios, como o João das Botas e o Medalha Milagrosa.

Entre os meus 15 e 17 anos, eu sentia algumas coisas, mas não sabia qual era a minha missão. Fui deixando isso de lado e me dedicando mais aos estudos. Eu era um jovem muito inteligente, a única matéria que eu não ia bem era matemática. O ISBA foi a última escola em que eu estudei. Cheguei a ser líder de grupo estudantil e preparei o pessoal do teatro para sair nas ruas. Isso foi na época de Collor. Depois cheguei a tentar fazer a faculdade de Direito, mas não terminei, porque fiquei muito doente e acabei abandonando.

Em seguida foram acontecendo várias coisas em minha vida, e minha família não entendeu muito bem. Fiz parte da Messiânica, com o reverendo Luiz Francisco, e lá chegava um pessoal estrangeiro. Nem eu sei como eu fazia isso, mas eu traduzia japonês para português. Eu conseguia traduzir quatro idiomas (japonês, inglês, francês e espanhol), mesmo sem nunca ter estudado!

Antes de Lourdes falecer, ela me levava no centro espírita e foi assim que eu conheci Mãe Menininha do Gantois. Nesse período que eu estava com muitos problemas que não tinham explicação, e ela disse que um dia eu entenderia qual era a minha missão, de ajudar as pessoas, mas até lá ainda receberia muitas pancadas da vida. Ela me passou um trabalho junto a Ogan, para beber sete garrafas com a água do mar, e também afirmou que eu já era protegido. Soube que na minha frente não era um orixá que comandava, mas um escravo. Ele era quem me protegia, mas também era quem me dava as pancadas.

Para o Jarê eu fui levado por um amigo. Ele havia me dito que lá não tinha muito preconceito, e eu fui. Só sei que quando começou o ritual eu estava na fila para tomar o passe e na minha vez pediram para o pessoal sair da sala. Me disseram que eu era uma pessoa especial. Nesse mesmo instante, a entidade baixou e falou em iorubá. Ogan me disse o que tinha para fazer, e eu fiz o ritual da garrafas com ele às 5:30 da manhã.

Quando eu era criança, já tinha mediunidade, eu via pessoas que já tinham morrido. Depois que cresci perdi um pouco disso, mas depois que eu batizei, através de Dona Norma, comecei a ver as coisas pelos sonhos. Os guias me alertavam quando algo estava para acontecer. Uma vez Iemanjá apareceu, toda de azul, e disse: “se você não tomar cuidado vai acontecer isso, você tem o poder de evitar que aconteça o pior”. Outras vezes eu estava dormindo, e diziam que alguém ia morrer. Sei que sofri muito, ninguém sabe metade do sofrimento que eu passei dentro de casas de saúde. Teve um tempo em que minha família achava que eu estava ficando louco, porque não sabiam que eu tinha essa missão.

Aos poucos Dona Norma foi me orientando. Foi ela quem fez o assentamento do moço, assim como todo o ritual, a bandeira, a pomba do divino. Nós trabalhamos também como os búzios, mas quem joga é a entidade Ogum Beira Mar – ele é quem comanda a mesa branca. Eu sou só o médium. É a entidade que abre a sessão e é o patrono capaz de dizer se os caminhos da pessoa estão abertos, se estão fechados ou se tem alguma coisa feita atrapalhando a vida dele. Antes de qualquer ritual tem que tomar banho de remédio – isso sou eu que faço. Ogum só desce quando realmente tem um trabalho. Temos também outros orixás, como Sultão, Iemanjá, Oxalá – que só desce se estivermos vestidos de branco. Além deles tem na casa o pai de santo, e o sino que chama os guias com orações.

Tem uma cantiga que a gente sempre canta que é:

“Ogum, ogum, é das ondas do mar, ogum beira mar”

O pessoal tem falado que o Jarê está acabando, mas na verdade o que está acontecendo é a falta de união entre os povos – sejam os irmãos de santo que ficam fazendo picuinha, outros que não respeitam os pais de santo ou até mesmo aos próprios orixás. Só digo que os mais novos têm que estudar as matrizes africanas e brasileiras, ter respeito por nossa ancestralidade.

Data e nomes das Festas: 

Data em aberto – Festa de Cosme

02 de fevereiro – Festa de Iemanjá

13 de agosto – Feijoada de Ogum